A GUERRA AO CÂNCER

Só quem já acompanhou um paciente de câncer sabe como essa doença pode ser cruel em seu estágio terminal. Ninguém gosta de pensar sobre o assunto. Muitos evitam até pronunciar a palavra, cuja origem latina quer dizer 'caranguejo', provavelmente por causa da semelhança entre as pernas do crustáceo e os tentáculos do tumor. Não admira que o câncer seja encarado pela maioria das pessoas como uma sentença de morte. Nas últimas décadas, apenas a Aids ameaçou roubar-lhe o título de doença que causa mais horror e pânico à humanidade. Há, no entanto, uma diferença fundamental: a síndrome da imunodeficiência adquirida é um mal que se pode prevenir totalmente. O câncer, não. Descontados alguns fatores de risco, ter ou não ter a doença é uma loteria, que mata por ano mais de 4 milhões de pessoas, 90.000 no Brasil.

Essa percepção da doença transformou o câncer em inimigo número 1 da medicina. A própria linguagem empregada pelos médicos e pesquisadores está recheada de expressões bélicas. Só se fala em guerra. 'Não damos um minuto de sossego ao inimigo', diz Sérgio Simon, um dos mais destacados cancerologistas brasileiros. Nos centros de pesquisa dos países ricos, onde se gasta uma média de 1,5 bilhão de dólares por ano em estudos, o principal campo de batalha se situa no próprio coração das células. Debruçados sobre o micromundo molecular, os pesquisadores tratam de abrir a caixa-preta que regula o funcionamento das células malignas.

NOVAS TÉCNICAS - Houve avanços importantes nos últimos vinte anos. A taxa de mortalidade dos cânceres da idade infantil, como a leucemia e o tumor de Wilmes (uma modalidade rara de câncer que atinge o rim), caiu de 70% para menos de 30% dos casos. O câncer de testículo e alguns linfomas (tumor no sistema linfático), letais até há pouco tempo, hoje apresentam índices elevados de cura. A qualidade de vida dos doentes deu um salto, graças a cirurgias não mutiladoras. Nos casos de câncer de mama, surgiu um novo tipo de operação, a quadrantectomia, que permite remover uma parte e não mais o seio inteiro de pacientes com o tumor em estágio inicial. Uma técnica cirúrgica reduziu de 100% para 50% o risco de impotência nas cirurgias de extração da próstata.

A quimioterapia, o tratamento à base de drogas que interfere no ciclo de reprodução celular, também evoluiu muito. Uma das principais novidades é um tipo de transplante de medula que consiste em retirar as células-mãe do sangue do paciente e congelá-las. (Tais células, essenciais à defesa do organismo, são as que se reproduzem mais depressa.) O doente, então, é submetido a uma dose potentíssima de quimioterapia. Em seguida, recebe de volta as próprias células, que estavam guardadas num banco de sangue, congeladas. Seria como tirar a mobília da sala para dedetizar o ambiente e depois colocar os móveis de volta. Há novos remédios que controlam melhor a náusea provocada pela quimioterapia, um dos piores efeitos colaterais do tratamento - o outro, estético, deixa o paciente totalmente careca porque mata, temporariamente, as células do bulbo capilar. A radioterapia, peça-chave do arsenal anticâncer, desenvolveu graças aos computadores uma técnica conformacional que permite melhorar a 'pontaria' dos feixes de raios desferidos contra o tumor. Mesmo com os avanços, prevenir continua sendo a melhor forma de vencer essa batalha.

Fonte: Revista Veja - Ed abril/96

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